quinta-feira, março 30, 2006

Arte... arte; Vida... vida

O mundo da representação (aqui refiro-me ao teatro, enquanto actividade profissional) é capaz de ser o mais verdadeiro de todos os mundos. Hoje, assisti a um documentário que me fez pensar, mais uma vez, em como somos constantemente enganados e apanhados nas teias da outra representação, de forma voluntária e despreocupada. Choramos por algo que não aconteceu, prometemos mundos e fundos e nem sabemos o que significam estes dois vocábulos, somos vítimas e culpados em simultâneo, neste palco que é a vida, mas não a Vida com V maiúsculo - esta, quem dera que pudéssemos, pelo menos, vislumbrá-la! - mas a vida vidinha, aquela que criamos com os nossos prórios sentidos, esquecendo que há sempre alguém do outro lado, no limite da nossa acção, a sofrer as consequências do que fazemos. Às vezes, esse alguém somos nós mesmos, é a tal Vida!
Neste novo mundo da informação que, pouco a pouco, tem invadido a minha vidinha e, quem sabe, tocado na Vida, por vezes, deparo-me com títulos como Os Intelectuais já não têm lugar na sociedade. E o pior é que estes jornalistas até têm razão! Ser intelectual é ridículo, pois essa atitude pressupõe o contacto com realidades que já não cabem no ritmo alucinante do nosso quotidiano. O que é que Descartes, Kant ou Habermas podem trazer-me de bom? Dá lucro? O quê, pensamentos? Tenho lá tempo para isso!
No início, falava do teatro, mas acabei de lembrar-me que até podia ter falado de qualquer outro tipo de arte, ou melhor, de Arte, pois não quero confusões com o que por aí se faz e que, vergonhosamente, também é chamado de arte (considerações para um próximo ataque de irritação). Voltando à Arte. Pois é, se observarmos o que ainda se faz neste campo hoje em dia, percebemos claramente a fuga de potenciais intelectuais, quando não o mal-estar de alguns calcados pela sociedade. A Arte contemporânea é um exemplo da doença que nos contaminou, no início do século XX e que continua a contaminar-nos, infelizmente, o século XXI. Mas, pelo menos, esses (os Artistas) encontraram uma saída, uma fuga, uma forma mais ou menos estética de nos dizerem, Estou-me nas tintas para estas obrigações sociais. Aqui há um ano atrás, falei com um pintor destes. Alucinado, com gana de percorrer o mundo a pé, mochila às costas, ultrapassando fronteiras geográficas e humanas; um ser excepcional, mas que só tinha aquele corpo para exprimir-se e, o que é pior, todo um contexto ocidental que não lhe permitiria (por mais rebelde que fosse) de ír para além do convencionalmente aceite.
Fico aqui a pensar o que será de nós, que nem para Artistas servimos...