A Alma do Mundo
No princípio era o redondo. A forma perfeita. A harmonia sublime de todos os sentimentos. A ausência completa de pensamento. O azul. Adão e Eva. A comunhão. Depois veio a força do tridente, que se cravou na rocha. Abriram-se brechas, fendas profundas. Vulcões, placas tectónicas, tremores-de-terra. Furacões, tempestades. Guerras, sofrimento, dor, tristeza. Confusão. E, como o redondo deixou de existir, a perfeição também desapareceu. O que era um passou a ser dois. O que era perfeito passou a revelar defeitos. O que era azul, passou a ser roxo. E depois? Adão e Eva afastaram-se um do outro e com eles dividiu-se a Alma do mundo. O pensamento começou a colocar questões: "Porquê?", "Quem sou eu?", "Que sentido tem isto para a minha vida?", "O que é a vida?". Os sentimentos, outrora peças indissociáveis que revestiam o redondo, quebraram-se, subdividiram-se. O que antes era Amor passou a ser carinho, respeito, amizade, sinceridade, lealdade, solidariedade. Mas, como o tridente deixou marcas de sangue nesta camada tão sensível do redondo, os sentimentos não só se subdividiram, como ficaram desorientados. Revestiram-se também de pensamento. Viraram-se para dentro e descobriram que, na confusão que se tinha instalado, já não havia motivos para estarem unidos, para fazerem parte de um todo. Então, tornaram-se egoístas e inventaram os seus contrários - o ódio, a vingança, a inveja, a dor, a traição. Inventaram-nos pois estavam livres, queriam experimentar-se. Podiam pensar. Que grande riqueza! Mas, o que correu mal foi a continuidade obrigatória de Adão e Eva. Se tivessem sucumbido à força do tridente, a confusão acabaria por se auto-aniquilar. Mas, não foi assim. Adão e Eva afastaram-se, mas tiveram de saber gerir a confusão, pois foi a eles que o tridente mais feriu de pensamento. Então, Adão e Eva descobriram que o redondo tinha existido. Mas, já era tarde demais. Estavam condenados.
Porém, não percamos a esperança. Somos guerreiros, também condenados, mas enquanto herdeiros do inevitável património de Adão e Eva, que não é senão eles mesmos, fazemos parte da Alma do mundo, do redondo, do sublime, da perfeição. É por isso que existem Almas Gémeas. É por isso que dois, por vezes, se tornam um e não sabem porquê. É por isso que existem orgasmos, não só na união dos corpos, mas sobretudo na união de mentes. Assim, nasceram a literatura, a pintura, a música. Assim nasceu o diálogo construtivo e a inegável compatibilidade entre seres. Assim, nasceram actos de uma pureza que não parece "deste mundo". E, quando um destes encontros se dá, a Alma do mundo reconstrói-se. A grande maravilha, o maior dos tesouros é quando deixamos que estes encontros permaneçam durante toda a nossa vida. Isso pode acontecer entre o artista e a sua obra. Ou entre dois amantes. Ou entre dois irmãos. Ou entre um homem e a natureza que o rodeia. Ou até mesmo entre a solidão e a palavra amiga, no momento certo. Desde que tenhamos a certeza que as peças encaixam. Ah, e como é bela essa certeza! Ela implica a rejeição de tudo o resto, a miséria, a insegurança. Mas, é a certeza que vale a pena. É a ínfima união de duas peças outrora distantes que é a Verdade, a única Verdade! O tridente já não volta, mas deixou a sua marca. Não podemos negá-la nem vencê-la, mas podemos combatê-la, pouco a pouco, com as nossas armas azuis, com a parte de nós que ainda se mantém inteira. Assim, aproveitemos cada encontro de peças para soldar a Alma do mundo. Vale a pena. É a grande luta. Ficarão sempre algumas peças perdidas, mas aquilo que reconstruímos hoje será o património dos que vierem, assim como nós o recebemos de Adão e Eva e dos que os seguiram.
Sejamos verdadeiros, pois todos encontramos, mais cedo ou mais tarde, uma ou mais peças que encaixam. É difícil, mas devemos soldá-las. É imperativo, pois as marcas do tridente deixam feridas cada vez mais numerosas e profundas. Devemos a nós mesmos essa re-união.
Porém, não percamos a esperança. Somos guerreiros, também condenados, mas enquanto herdeiros do inevitável património de Adão e Eva, que não é senão eles mesmos, fazemos parte da Alma do mundo, do redondo, do sublime, da perfeição. É por isso que existem Almas Gémeas. É por isso que dois, por vezes, se tornam um e não sabem porquê. É por isso que existem orgasmos, não só na união dos corpos, mas sobretudo na união de mentes. Assim, nasceram a literatura, a pintura, a música. Assim nasceu o diálogo construtivo e a inegável compatibilidade entre seres. Assim, nasceram actos de uma pureza que não parece "deste mundo". E, quando um destes encontros se dá, a Alma do mundo reconstrói-se. A grande maravilha, o maior dos tesouros é quando deixamos que estes encontros permaneçam durante toda a nossa vida. Isso pode acontecer entre o artista e a sua obra. Ou entre dois amantes. Ou entre dois irmãos. Ou entre um homem e a natureza que o rodeia. Ou até mesmo entre a solidão e a palavra amiga, no momento certo. Desde que tenhamos a certeza que as peças encaixam. Ah, e como é bela essa certeza! Ela implica a rejeição de tudo o resto, a miséria, a insegurança. Mas, é a certeza que vale a pena. É a ínfima união de duas peças outrora distantes que é a Verdade, a única Verdade! O tridente já não volta, mas deixou a sua marca. Não podemos negá-la nem vencê-la, mas podemos combatê-la, pouco a pouco, com as nossas armas azuis, com a parte de nós que ainda se mantém inteira. Assim, aproveitemos cada encontro de peças para soldar a Alma do mundo. Vale a pena. É a grande luta. Ficarão sempre algumas peças perdidas, mas aquilo que reconstruímos hoje será o património dos que vierem, assim como nós o recebemos de Adão e Eva e dos que os seguiram.
Sejamos verdadeiros, pois todos encontramos, mais cedo ou mais tarde, uma ou mais peças que encaixam. É difícil, mas devemos soldá-las. É imperativo, pois as marcas do tridente deixam feridas cada vez mais numerosas e profundas. Devemos a nós mesmos essa re-união.
1 Comments:
E já que nunca estamos sós... vamos lá desatar os nós... e vamos chegar inteiros onde quer que a Vida nos leve...
Perfeito. Como Sempre.
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